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A teoria de ex-tudo


- Tudo bem?


O cumprimento foi protocolar. Talvez uma resposta tão formal ou vazia seria devolver a pergunta: sim, e com você? Ou ainda bancar o chato: relatar, tintim por tintim, os bons e maus momentos desde o último encontro.


Mas a resposta veio tão evasiva quanto a pergunta:


- Nada mau.


Diante da cara de espanto, ou surpresa, de Nihil, o alfaiate acrescentou:


- Pois é... será possível não se ter passado nada de ruim? Nem um pouquinho? E... será possível que tudo, absolutamente tudo, esteja ótimo? Sem qualquer contratempo? Sem uma pequena contrariedade que seja?


Audite e Nihil se entreolharam, assim sem saber o que dizer. E voltaram os olhares para o alfaiate, que retomou:


- Dizem que não existe o nada. Nem a palavra nada é nada. Coisa um tanto incoerente, não acham? Então, também não existe o tudo. A palavra tudo é apenas uma entre tantas outras do léxico.

Audite e Nihil ficaram à espera de uma sequência do raciocínio. O que veio em seguida, entretanto, foi outro questionamento:


- Como explicar que se busque uma teoria do tudo? Como explicar que não se busque também uma teoria do nada?


A dupla de auditores permaneceu muda, na expectativa de algo afirmativo. Mas o que se seguiu foi um prolongado silêncio, muito além do que seria razoável para elaborar uma explanação. Quase que sincronicamente, sem prévia combinação, deixaram escapar uma ansiedade implícita:


- E...?


- Bem, respondeu o alfaiate, como se estivesse aguardando aquela intervenção para prosseguir, nossas investigações e experimentos... digo, dos kyneplaztaz e kryptykos... parecem indicar que, a despeito do senso comum... científico, quero dizer... sobre a possibilidade de um efetivo campo unificado das forças do universo... que possam ser reunidas numa "teoria de tudo", nossa comunidade pende para uma concepção diferente da realidade...


- Que é...?, os auditores tentaram apressar a argumentação do alfaiate.


- Que é... não existe o todo. Não existe o tudo, como não existe o nada.


- Então, não existimos?, raciocinou de imediato Audite.


- Existimos. O que não existe é o tudo, o todo. Assim também o nada. Se somos algo, não somos nada. E sendo algo, isto é, alguma coisa, não somos muitas coisas, muito menos tudo, todas as coisas... se é que existe uma quantidade finita de coisas.























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