Compartilhando uma das mesas da lotada cafeteria, o alfaiate e o bancário conversavam tão longa e intensamente que mal lhes importunava o alto burburinho do local. Estavam tão envolvidos que a conversa parecia imune ao som ambiente, indiferentes à reverberação das falas indistintas, às quais se sobrepunham os brados dos garçons antecipando ao balcão os pedidos dos clientes.
E mal se aperceberam do repentino silêncio que tomou conta do local, até se darem conta de que o salão ecoava apenas as suas próprias vozes. E se calaram, voltando-se para ver do que se tratava.
Isso se deu pouco depois que, cansado da movimentação junto ao Caixa, o dono da cafeteria pediu ao gerente que o substituísse no posto e. espreguiçando-se ligeiramente, chegou à porta e ficou à porta. Após alguns minutos, dobrou a esquina um cortejo fúnebre. O proprietário avisou aos funcionários próximos o que estava acontecendo. Ouvido pelos clientes, fez-se repentinamente aquele silêncio. Muitas pessoas vieram à porta, homens e mulheres. E, quando o enterro passou, os homens que se achavam no café tiraram o chapéu. Foi um gesto de reverência, mas mecânico, estavam ainda absorvidos pela vitalidade, a plenitude da vida e a confiança no futuro que se projetava de suas animadas falas.
E a ninguém ocorreu se perguntar: qual pessoa era essa que passava?
O alfaiate, que logo depois viera à porta, a tempo de presenciar a passagem e o afastamento do cortejo, quedou-se mirando o esquife que passava. Seu pensamento sussurrava a insignificância da vida, o vazio traidor. E, respeitosamente, na profundidade do seu ser, saudou a matéria inerte, enfim liberta, para todo o sempre, da alma extinta.
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