Não sei se o riso está incluído em algum catálogo de instrumentos musicais. Se ainda não está, acho que já é tempo de se fazer isso. É evidente que não se trata de tarefa fácil. Afinal, não é um instrumento fabricado em série. É como se fosse artesanal. Ou melhor, feito sob encomenda, uma exclusividade de cada um. E existem diferenças significativas de confecção. Certos risos são suaves, outros ásperos, há os ostensivos e os discretos, espontâneos e premeditados, afinados e desafinados.
Mas há algumas qualidades que poderiam servir de critérios para essa sugerida catalogação. Se é que isso seria algo realmente necessário. Uma dessas, que certamente estariam no grupo de qualidades fundamentais, é o contágio. Aquele convite tácito e irresistível a participar de um momento de descontraída alegria.
A manifestação mais essencial desse contágio, entretanto, não está atrelada a um choque cômico, ao desfecho de uma situação anedótica ou hilariante. É o riso que toca o humor das pessoas pela sua espontaneidade, gerando um momento de graça em si, que vibra nos outros por mera ressonância no íntimo de cada um. Energia de cócegas cósmicas.
Ouvi pela primeira vez o riso de Heloísa Petri no intervalo de um ensaio do Madrigal Ars Viva, do qual éramos recém integrantes, com pequena diferença de meses. Acho que ouvi o seu riso antes mesmo de ouvir o seu canto. Quanto à sua voz, tive o privilégio de contar com ela em algumas composições corais (incluindo a estreia de Gravitando), e em outras para canto, solista e em duo (Prenascença, No Belo Eridano Azul). Mas o que fica dessa história é a viva relação entre o seu riso e o seu canto. Desde aquele instante em que ouvi o riso de Heloísa Petri foi essa a sensação que experimentei: de ouvir um instrumento musical. E desse dia em diante, sempre que a ouço cantar, por trás de cada nota, sinto a presença permanente desse som-riso contagiante, desse instrumento especial que é a alma do seu canto.
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